Para assinalar um ano e quatro meses passados sobre o dia 7 de Outubro de 2023.

    Pax   Podia ter sido o espartilho de uma tradição inexorável. Podia ter sido um preconceito religioso arreigado. Podia ter sido um ressentimento social vulcânico ou uma concorrência económica desenfreada. Podia ter sido um delírio alucinatório, esquizofrénico, visceralmente conspirativo. Ou podia até ter sido uma qualquer repugnância fisiológica irracional – sangue contra sangue. Qualquer coisa de viril. No Ocidente – foram palavras de ordem passageiras. Foi a intersecção de noções vagas. Foi uma maranha de pequenas impressões e emoções anémicas e evanescentes, herdadas de pais pelos filhos – they are the world; they are the children. Uma culpabilidade postiça, de bom tom, salonsfähig em reuniões de soixante-huitards, debitada com um sorriso metálico e grande doçura de palavras. Um infantilismo monádico, cujo máximo de alteridade a que chega é extasiar-se diante de um espelho, para o qual lá fora nada há e amanhã nada há. A mascarada da compaixão exibida, narcisicamente bem cepilhada. Confortável materialmente, confortável moralmente. Uma tão pequena pedra de escândalo para uma tão grande queda.                                                                     João Tiago Proença

Fev 7, 2025 - 11:03
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Para assinalar um ano e quatro meses passados sobre o dia 7 de Outubro de 2023.

 

 



Pax

 

Podia ter sido o espartilho de uma tradição inexorável. Podia ter sido um preconceito religioso arreigado. Podia ter sido um ressentimento social vulcânico ou uma concorrência económica desenfreada. Podia ter sido um delírio alucinatório, esquizofrénico, visceralmente conspirativo. Ou podia até ter sido uma qualquer repugnância fisiológica irracional – sangue contra sangue. Qualquer coisa de viril.

No Ocidente – foram palavras de ordem passageiras. Foi a intersecção de noções vagas. Foi uma maranha de pequenas impressões e emoções anémicas e evanescentes, herdadas de pais pelos filhos – they are the world; they are the children. Uma culpabilidade postiça, de bom tom, salonsfähig em reuniões de soixante-huitards, debitada com um sorriso metálico e grande doçura de palavras. Um infantilismo monádico, cujo máximo de alteridade a que chega é extasiar-se diante de um espelho, para o qual lá fora nada há e amanhã nada há. A mascarada da compaixão exibida, narcisicamente bem cepilhada. Confortável materialmente, confortável moralmente.

Uma tão pequena pedra de escândalo para uma tão grande queda. 


                                                                    João Tiago Proença