Marcos Sacramento amplifica ponto luminoso da trajetória com a energia vibrante e a exuberância do show ‘Arco’

No show ‘Arco’, Marcos Sacramento incursiona sem obviedade pelos repertórios de Carmen Miranda e Elis Regina Rodrigo Goffredo ♫ OPINIÃO SOBRE SHOW Título: Arco Artista: Marcos Sacramento Data e local: 31 de janeiro de 2025 no Manouche (Rio de Janeiro, RJ) Cotação: ★ ★ ★ ★ ★ ♬ Embora já seja um veterano das rodas cariocas, Marcos Sacramento vive momento especialmente luminoso na trajetória artística desde o lançamento do álbum Arco (2024) em novembro. Um dos grandes discos brasileiros do ano passado, Arco se beneficiou da fricção entre tradição e modernidade, gerando som feito com frescor e amplificado no show gerado pelo disco criado por Sacramento sob direção artística de Phil Baptiste. No show Arco, estreado no clube Manouche na cidade do Rio de Janeiro (RJ) – com duas concorridas apresentações em 25 e 31 de janeiro – e já programado para voltar à cena em 26 de abril no Teatro Rival, Sacramento confirma e amplifica o momento de auge artístico ao seguir roteiro que extrapola o giro do disco sem diluir a unidade e a força do trabalho. Sob direção musical do guitarrista Elisio Freitas, nome fundamental na arquitetura do álbum, o cantor e compositor fluminense – nascido em Niterói (RJ) em julho de 1960 – apresenta show vibrante, enérgico, feito na pressão. Já no prólogo, quando abre caminho ao defumar palco e plateia com incenso enquanto entoa cântico afro-brasileiro, Sacramento já domina a cena e ganha o público. Esse domínio permanece ao longo do show feito pelo cantor com o toque afiado da banda formada por Alexandre Kassin (baixo), Antonio Dal Bó (teclados), Elisio Freitas (guitarra), Estevam Barbosa (bateria), Luiz Flavio Alcofra (violão) e Netinho Albuquerque (percussão). A vibração do show é sustentada do primeiro número – a música-título Arco (Marcos Sacramento, 2024), envolvida em atmosfera noise – à derradeira música do bis, Cai dentro (Baden Powell e Paulo César Pinheiro, 1979), samba no qual o cantor parece encanar moderno rei do telecoteco ao cair no suingue com destreza. Em Cai dentro, o cantor mostra incrível domínio rítmico que já assombrara o público no canto cada vez mais ágil de Disseram que eu voltei americanizada (Luiz Peixoto e Vicente Paiva, 1940), samba no qual Sacramento destila finas ironias e sarcasmos sem imitar os balangandãs de Carmen Miranda (1909 – 1955), para quem a música foi feita. Do repertório de outra voz imortal dos trópicos, Elis Regina (1945 – 1982), o cantor pesca a pérola Meio termo (Lourenço Baeta e Cacaso, 1978), grande e denso momento do show em que Sacramento mostra que é possível incursionar pela seara de Elis com personalidade sem patinar no terreno da obviedade (o samba Cai dentro também foi lançado pela cantora em 1979 no álbum Elis, essa mulher). Momentos antes, a personalidade do intérprete já ficara evidenciada com a abordagem de sucesso de Alcione, Você me vira a cabeça (Me tira do sério) (Chico Roque e Paulo Sérgio Valle, 2001), cantado com arranjo de peso, situado entre o blues e o rock pelo toque da guitarra de Elisio Freitas. Tem também um toque de rock no arranjo jazzy latino de Todo amor que houver nessa vida (Roberto Frejat e Cazuza, 1982), balada que Sacramento canta com Zé Ibarra na gravação do álbum Arco. Marcos Sacramento canta no show as onze músicas do álbum ‘Arco’ Rodrigo Goffredo E por falar no disco, todas as onze músicas do álbum figuram no roteiro do show, geralmente com mais potência, casos do onírico samba Jesus é preto (Marcos Sacramento e Paulo Baiano, 2024), de Guanabara (Luiz Flavio Alcofra, Marcos Sacramento e Phil Baptiste, 2024) e de Niterói (Manu da Cuíca, Luiz Carlos Máximo, Marcos Sacramento e Fernando Leitzke Júnior, 2024). Os dois últimos sambas são banhados pela mesma geografia do mar que vem da Bahia. A propósito, a origem da rota existencial e musical de Marcos Sacramento é realçada pelo canto de Bahia-Rio (Luiz Flavio Alcofra e Marcos Sacramento, 2024) em percurso seguido em cadência afro-baiana. Se o intérprete se vale de letra de Thiago Amud para defender que a canção não vai morrer, como Sacramento sentencia ao dar voz a verso de Graça (2021), a teoria é comprovada na prática com o canto da canção autoral Para Frido (Marcos Sacramento, 2024), composta para o grande amor do artista. A paixão também é o mote de Tonada de luna llena (Simón Díaz, 1973), tema venezuelano que se impõe como um dos (muitos) grandes momentos do show pela intensidade do arranjo e da interpretação de Sacramento. Em cena, a abordagem exuberante do samba Voltei (Baden Powell e Paulo César Pinheiro, 1986) reitera a sensação de que o álbum, gigante por si só, cresce ainda mais no show, cujo roteiro é acrescido de hits do Samba do Sacramento, roda mensal com a qual o cantor arrasta multidões para o centro do Rio de Janeiro (RJ). Por conta da roda, entram no giro do show sucessos como Oxóssi (Roque Ferreira, 2004), Lendas da mata (João Martins e Raul DiCaprio, 2008), Samba de Arerê (Xande de Pilares, Arlindo Cruz e Mauro Júnior, 1999)

Fev 2, 2025 - 16:54
 0
Marcos Sacramento amplifica ponto luminoso da trajetória com a energia vibrante e a exuberância do show ‘Arco’

No show ‘Arco’, Marcos Sacramento incursiona sem obviedade pelos repertórios de Carmen Miranda e Elis Regina Rodrigo Goffredo ♫ OPINIÃO SOBRE SHOW Título: Arco Artista: Marcos Sacramento Data e local: 31 de janeiro de 2025 no Manouche (Rio de Janeiro, RJ) Cotação: ★ ★ ★ ★ ★ ♬ Embora já seja um veterano das rodas cariocas, Marcos Sacramento vive momento especialmente luminoso na trajetória artística desde o lançamento do álbum Arco (2024) em novembro. Um dos grandes discos brasileiros do ano passado, Arco se beneficiou da fricção entre tradição e modernidade, gerando som feito com frescor e amplificado no show gerado pelo disco criado por Sacramento sob direção artística de Phil Baptiste. No show Arco, estreado no clube Manouche na cidade do Rio de Janeiro (RJ) – com duas concorridas apresentações em 25 e 31 de janeiro – e já programado para voltar à cena em 26 de abril no Teatro Rival, Sacramento confirma e amplifica o momento de auge artístico ao seguir roteiro que extrapola o giro do disco sem diluir a unidade e a força do trabalho. Sob direção musical do guitarrista Elisio Freitas, nome fundamental na arquitetura do álbum, o cantor e compositor fluminense – nascido em Niterói (RJ) em julho de 1960 – apresenta show vibrante, enérgico, feito na pressão. Já no prólogo, quando abre caminho ao defumar palco e plateia com incenso enquanto entoa cântico afro-brasileiro, Sacramento já domina a cena e ganha o público. Esse domínio permanece ao longo do show feito pelo cantor com o toque afiado da banda formada por Alexandre Kassin (baixo), Antonio Dal Bó (teclados), Elisio Freitas (guitarra), Estevam Barbosa (bateria), Luiz Flavio Alcofra (violão) e Netinho Albuquerque (percussão). A vibração do show é sustentada do primeiro número – a música-título Arco (Marcos Sacramento, 2024), envolvida em atmosfera noise – à derradeira música do bis, Cai dentro (Baden Powell e Paulo César Pinheiro, 1979), samba no qual o cantor parece encanar moderno rei do telecoteco ao cair no suingue com destreza. Em Cai dentro, o cantor mostra incrível domínio rítmico que já assombrara o público no canto cada vez mais ágil de Disseram que eu voltei americanizada (Luiz Peixoto e Vicente Paiva, 1940), samba no qual Sacramento destila finas ironias e sarcasmos sem imitar os balangandãs de Carmen Miranda (1909 – 1955), para quem a música foi feita. Do repertório de outra voz imortal dos trópicos, Elis Regina (1945 – 1982), o cantor pesca a pérola Meio termo (Lourenço Baeta e Cacaso, 1978), grande e denso momento do show em que Sacramento mostra que é possível incursionar pela seara de Elis com personalidade sem patinar no terreno da obviedade (o samba Cai dentro também foi lançado pela cantora em 1979 no álbum Elis, essa mulher). Momentos antes, a personalidade do intérprete já ficara evidenciada com a abordagem de sucesso de Alcione, Você me vira a cabeça (Me tira do sério) (Chico Roque e Paulo Sérgio Valle, 2001), cantado com arranjo de peso, situado entre o blues e o rock pelo toque da guitarra de Elisio Freitas. Tem também um toque de rock no arranjo jazzy latino de Todo amor que houver nessa vida (Roberto Frejat e Cazuza, 1982), balada que Sacramento canta com Zé Ibarra na gravação do álbum Arco. Marcos Sacramento canta no show as onze músicas do álbum ‘Arco’ Rodrigo Goffredo E por falar no disco, todas as onze músicas do álbum figuram no roteiro do show, geralmente com mais potência, casos do onírico samba Jesus é preto (Marcos Sacramento e Paulo Baiano, 2024), de Guanabara (Luiz Flavio Alcofra, Marcos Sacramento e Phil Baptiste, 2024) e de Niterói (Manu da Cuíca, Luiz Carlos Máximo, Marcos Sacramento e Fernando Leitzke Júnior, 2024). Os dois últimos sambas são banhados pela mesma geografia do mar que vem da Bahia. A propósito, a origem da rota existencial e musical de Marcos Sacramento é realçada pelo canto de Bahia-Rio (Luiz Flavio Alcofra e Marcos Sacramento, 2024) em percurso seguido em cadência afro-baiana. Se o intérprete se vale de letra de Thiago Amud para defender que a canção não vai morrer, como Sacramento sentencia ao dar voz a verso de Graça (2021), a teoria é comprovada na prática com o canto da canção autoral Para Frido (Marcos Sacramento, 2024), composta para o grande amor do artista. A paixão também é o mote de Tonada de luna llena (Simón Díaz, 1973), tema venezuelano que se impõe como um dos (muitos) grandes momentos do show pela intensidade do arranjo e da interpretação de Sacramento. Em cena, a abordagem exuberante do samba Voltei (Baden Powell e Paulo César Pinheiro, 1986) reitera a sensação de que o álbum, gigante por si só, cresce ainda mais no show, cujo roteiro é acrescido de hits do Samba do Sacramento, roda mensal com a qual o cantor arrasta multidões para o centro do Rio de Janeiro (RJ). Por conta da roda, entram no giro do show sucessos como Oxóssi (Roque Ferreira, 2004), Lendas da mata (João Martins e Raul DiCaprio, 2008), Samba de Arerê (Xande de Pilares, Arlindo Cruz e Mauro Júnior, 1999), Imperador do samba (Waldemar Silva, 1937) – este lançado pela mesma Carmen Miranda que deu voz e verve a Disseram que eu voltei americanizada – e Sorriso aberto (Guaraci Sant'anna, o Guará, 1988). O interessante é que esse bloco do Samba do Sacramento se integra perfeitamente ao roteiro de Arco, show que reitera o momento brilhante da caminhada de Marcos Sacramento, bamba de antigos Carnavais. Marcos Sacramento eletriza o público do clube Manouche com a exuberância do show ‘Arco’ Rodrigo Goffredo