Crítica | Bolero – A Melodia Eterna (2024): um criador em conflito com sua criatura
Ao explorar de forma única a composição de uma das peças musicais mais ouvidas de todos os tempos, o longa nos guia pelas fascinantes contradições de um homem em conflito com o seu legado e com os próprios desejos. O post Crítica | Bolero – A Melodia Eterna (2024): um criador em conflito com sua criatura apareceu primeiro em Cinema com Rapadura.
Um criador atônito com a própria criação. Maurice Ravel compôs Bolero, possivelmente uma das peças musicais mais ouvidas (direta ou indiretamente) dos últimos cem anos. Entretanto, pode-se dizer que Ravel não era um dos maiores fãs da sua composição. Essa contradição é um dos pontos mais explorados em “Bolero – A Melodia Eterna“, longa de Anne Fontaine (“Coco Antes de Chanel”) que explora a vida do compositor e a gênese de sua obra mais conhecida.
Interpretado com notável distinção por Raphaël Personnaz, o Ravel que vemos em cena é um homem guiado pela fervoroso desejo de criar música e ser reconhecido por suas obras. Provocado pela coreógrafa e dançarina Ida Rubenstein (Jeanne Balibar), ele busca inspiração em fontes inesperadas, sendo este o plot principal pelo qual acompanhamos o protagonista.
Embora haja um desejo intenso em seu interior que ele mesmo parece ignorar ou até mesmo renegar, o fascinante Ravel de Personnaz compara o seu processo de composição com o de uma gestação, com a ironia dessa declaração não escapando ao filme, especialmente citando a demora e a dor envolvidos nesses atos. É interessante notar como Personnaz interpreta seu Ravel como um homem extremamente charmoso, mas que parece estar o tempo todo refreando seus próprios desejos, em especial em relação a Misia (Dora Tillier), irmã de seu melhor amigo, Cipa (Vincent Perez).
Em meio a uma apaixonante Paris dos anos 1920, lindamente recriada e explorada pela diretora e sua equipe, onde artistas eram incentivados a deixar fluir suas vontades, esse refreamento de Ravel torna o personagem único na narrativa, dando momentos absolutamente únicos para Personnaz brilhar em cena, enquanto frustração e criação se misturam na jornada até a concepção de Bolero.
Incapaz de enxergar a força sexual de sua obra, posteriormente explorada à enésima potência, Ravel a renega. É neste ponto que o longa de Fontaine se torna único, ao explorar a inocência ou cegueira do genial compositor em relação aos próprios complexos, especialmente quando se mostra mais fragilizado, transformando “Bolero – A Melodia Eterna” em uma apaixonante obra sobre um homem tentando ficar em paz com seus desejos e seu legado.
*Filme visto no Festival Varilux de Cinema Francês 2024.
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